A BilheteiraOnline entrevista Mario Dorminsky
20 - fev - 13
O 33º Festival Internacional de Cinema do Porto acontece entre 25 de Fevereiro e 10 de Março, no Rivoli Teatro Municipal.
Mamã será apresentado em ante-estreia na abertura do Fantas, a 1 de Março.
A BilheteiraOnline foi entrevistar o organização para saber pormenores
Fantasporto 2013
Qual o seu género de cinema favorito? E realizador, actriz e actor?
MD: Não tenho propriamente um género de cinema favorito. O cinema para mim é um prazer para os sentidos quando se tratam de bons filmes, sejam eles de que género forem. Realizador...vários, mas se quer um Orson Welles. Actriz e actor...É impossível dizer. Felizmente há muitos. Muitos mesmo.
O Fantasporto realiza-se no Porto desde a sua fundação. Nunca pensaram em mudar de cidade? Porquê?
MD: Já por várias vezes e, em particular os últimos anos. De qualquer forma algo nos "obriga a ficar" no Porto. Somos sobretudo portuenses, E a nossa cidade tem de manter um ícone cultural com o é o Fantasporto, o maior e mais importante Festival Internacional de Cinema realizado em Portugal. E...se pensamos em mudar de cidade foi exclusivamente pelas dificuldades financeiras que advêm de estarmos num Norte cada vez mais longe do poder politico e económico...sedeado em Lisboa.
Como é que se define a programação de um evento como o FantasPorto? Quais são os critérios? Com que antecedência?
MD: Acompanhamos a produção dos filmes que são realizados a nível Mundial desde o momento em que são anunciados pelos seus produtores, Depois vimos a saber quem é o realizador(a), os actores e conhecendo, como é o nosso caso, os valores de produção de cada um deles...uns vamos deixando "cair", outros esperamos ansiosamente que fiquem concluídos. Aí são vistos e seleccionados ou não. Daí que as cerca de 3.00 propostas de filmes que recebemos anualmente sirvam pouco para a programação final de cada Fantasporto - ela é feita antes. A lógica de programação existe em função do nosso gosto, dos nossos públicos (são vários...) e que conhecemos bem, nunca esquecendo também os verdadeiros e tradicionais cinéfilos da "velha guarda". Para lhe responder à última questão...não há antecedência...dependemos como disse da altura em que os filmes estão terminados e "fechamos" a programação de forma a que esta possa ser anunciada sempre no início de Fevereiro de cada ano.
Como justificam a presença de cinema Oriental novamente numa edição do Fantasporto?
MD: Há este ano bons filmes vindos do Oriente...o que não existia no ano passado. De qualquer forma é uma das regiões de produção cinematográfica do nosso Planeta à qual sempre demos atenção. Logo em 1981, no primeiro Fantasporto já exibíamos um filme chinês e no final da década de 80 fomos responsáveis pela "entrada" na Europa do cinema coreano...
Como podemos resumir a apresentação das quatro secções oficiais do Fantasporto da edição deste ano? Ou seja, Cinema Fantástico, Semana dos Realizadores, Orient Express e Cinema Português?
MD: Pelo óbvio...Fantástico, a origem do fantasporto, cinema não realista, do imaginário, Semana dos Realizadores, cinema de autor e descoberta de novos talentos e cinematografias (só este ano temos 38 países representados); Orient Express...o tal cinema do longínquo Oriente e o Português que naturalmente sempre apoiamos sendo essa uma das principais funções de um festival como o Fantasporto que é dar a conhecer o que é "nosso".
O Fantasporto vai atribuir o Prémio de Carreira ao realizador português António de Macedo. A Filmografia de António de Macedo é bastante vasta, existe algo que pretendem destacar com a atribuição deste prémio? O quê?
MD: Que António de Macedo é o único cineasta português que sempre fez filmes vocacionados para o cinema do imaginário, do fantástico e que teve logo no ano 1 do Fantas um filme seleccionado e no ano seguinte foi logo membro do Júri Internacional. É um dos pais de "honra" do Fantas.
Porquê uma retrospectiva dedicada aos grandes nomes dos anos dourados da cinematografia francesa na edição do Fantasporto deste ano?
MD: É natural...em 33 anos de vida já mostramos praticamente TUDO o que foi feito na história de cinema e que merece ser visto e analisado. Já exibimos naturalmente muito cinema francês clássico ao longo deste muitos Fantas e tínhamos de conceber um conceito diferente para esta mostra, daí a escolha das "stars"...as estrelas do cinema francês, os nomes que no fundo o deram a conhecer ao Mundo essa cinematografia no seu período áureo.
De acordo com o anunciado em Janeiro, 2013 é o ano da Literatura, pedra fundamental da boa escrita de argumento, da crítica cinematográfica e da cultura em geral para o Fantasporto. A organização dedicará particular atenção ao tema, apresentando através da voz de escritores e investigadores profissionais, áreas da cultura que permitirão aos espectadores compreender melhor o processo criativo e de investigação que existe por detrás dos filmes. Conferências, exposições e invariavelmente retrospectivas e muitas sessões especiais, preenchem a programação do festival. Porquê esta interacção e esta pluridisciplinaridade que vai muito além da 7ª arte no Fantasporto?
MD: É fundamental que um Festival o seja verdadeiramente. Festival é um termo abrangente e que no caso do Fantasporto, foi sempre assumido como tal. Logo em 81 tivemos paralelamente ao cinema espectáculos de música clássica, de rock, mostras de banda desenha, exposições de artes plásticas etc. Anualmente trabalhamos temas que vão do Saber ao Lazer. Do Conhecimento às Artes. Assim Arquitetura, Artes Plásticas, áreas diversas conexas com o cinema como efeitos especiais, escrita de argumento, tudo isto passando ainda pela robótica ou pela óptica tiveram espaços próprios no evento. São iniciativas importantes "dentro" de cada Fantas e sempre contando com a participação de especialistas portugueses e estrangeiros representantes de todas as áreas que são abordadas. Ainda no ano passado o tema foi o Futuro e foi trabalhado em 18 valências diferentes, da medicina às artes plásticas, do Jornalismo à Biologia e por aí fora. Qual o seu futuro...os comentários e as respostas ficaram no "ar" para que melhor ficássemos a SABER o que pensam os especialistas do futuro nessas diversas matérias.
Qual foi a maior dificuldade na realização da edição do Fantasporto este ano?
MD: O não saber se o poderíamos concretizar a 20 dias do seu início, isto com o programa já anunciado e tudo "montado" para o seu arranque. Porquê? Falta de capacidade financeira "para lhe dar vida" e ser ainda melhor do que tem sido. É isso que as pessoas esperam de cada Fantasporto: que seja sempre melhor do que o do ano anterior...
Recentemente o FantasPorto lançou um apelo para que seja criado um circuito de cinema paralelo em Portugal. Porquê e para que efeito?
MD: O nosso mercado de distribuição cinematográfico é extremamente limitado. E, segundo as últimas estatísticas fornecidas pelo Instituto de Cinema e do Audiovisual, o número de espectadores nas salas é dos menores da Europa.
Nos últimos anos a opção para muitos é ver cinema, sim, mas em casa, nos cada vez mais sofisticados sistemas de imagem e som. A realidade é que agora ainda se vê mais cinema do que no passado, mas não na “sala escura”.
Para salvar esta indústria e para garantir diversidade na oferta, há uma necessidade urgente, a exemplo dos Estados Unidos e de muitos países europeus, de se criar um segundo circuito de exibição. Um circuito paralelo garantido por estruturas empreendedoras cinéfilas, cineclubes, festivais, mostras que possam também exibir o chamado “outro” cinema. Aquele que apela a atenção dos cinéfilos, e não só o que proporciona momentos de lazer ao público em geral. Só tal decisão é que pode dar uma nova vida ao mercado do audiovisual.
A propósito de uma notícia que surgiu recentemente nos média sobre o fecho de mais salas de exibição, tal é como é evidente, culturalmente grave para os públicos das cidades onde elas se situavam. O mercado de exibição cinematográfica vai-se concentrando cada vez mais num ou noutro exibidor e a “abertura de portas” para a entrada de uma maior diversidade de filmes nas salas existentes vai ficando cada vez mais limitada. A somar a isto, temos o facto de que dezenas de cidades em Portugal não possuírem há muito tempo, a sua sala de cinema a funcionar, não permitindo aos seus habitantes o acesso a um produto cultural e de lazer de custo baixo e, também por isso, apelativo nos tempos que correm.
A ocupação total das salas com filmes das multinacionais norte-americanas levou à impossibilidade de um pequeno ou médio distribuidor, que não possui salas (e são quase todos), conseguir estrear filmes emergentes de cinematografias que não se enquadram na lógica de exibição actual. E aí também há fecho de empresas. Haveria ainda uma alternativa comercial que seria a edição de DVD´s mas a lógica que impera actualmente no mercado “obriga” a que só os filmes estreados em sala “têm direito” a ser distribuídos.
Este panorama complementa-se ainda com a opção das televisões em canal aberto deixarem de adquirir direitos de filmes para exibição nas suas grelhas de programação que não sejam norte-americanos e de produtoras multinacionais, sendo essa também a tendência dos canais de cinema existentes com emissão via cabo. Resumindo, temos três ou quatro distribuidoras em Portugal realmente ainda a funcionar.
UM CIRCUITO PARALELO
É assim imprescindível, para alterar todo este panorama, que seja criado um circuito paralelo de cinema que proporcione o visionamento de obras europeias, asiáticas que são, muitas vezes, e nos seus países de origem, grandes sucessos de bilheteira.
E quem tem feito em parte esse trabalho? Centenas de pequenas estruturas, com características semelhantes a cineclubes que exibem, na maioria das vezes, de forma ilegal, filmes em DVD ou Bluray que por aí vão comprando, ou pior ainda, que “sacam” em download da net. Este saque é algo que aliás acontece até nos programas de cinema organizados na generalidade de entidades privadas e públicas e escolas!
Um mercado audiovisual com estas características é, no mínimo, desastroso.
É urgente que reapareçam as pequenas e médias distribuidoras que conseguiam, até há bem poucos anos, explorar comercialmente os filmes cujos direitos adquiriam para a sua exibição em cinema, os lançavam em DVD e/ou vendiam os direitos para que fossem exibidos em televisão. Distribuidoras que pretendiam dar a conhecer o “outro” cinema e que perderam totalmente a sua capacidade de interagir com o mercado.
(Aqui ,um parêntesis para falar da estrutura que organiza o Fantasporto, a Cinema Novo, a qual durante anos funcionou também como distribuidora, única forma de se auto-financiar, estreando regularmente, e até com sucesso, os filmes que adquiria, (que normalmente tinham sido exibidos no Fantasporto), editava DVD´s e os conseguia vender às TV´s em canal aberto. Tal como aconteceu às outras distribuidoras, a Cinema Novo viu essa actividade desaparecer por completo, com as implicações financeiras negativas inerentes a tal situação.)
Fechado este parêntesis pode-se dizer claramente que criar esse circuito paralelo até nem será difícil. Há salas de cinema que se encontram encerradas por todo o país. Seria assim necessário dar-lhes vida, criando um programa oficial de apoio à exibição e à instalação de sistemas de projecção digitais, tal como há anos já existiu para a montagem do chamado “som dolby” nas salas.
Complementando esta iniciativa será também urgente fortalecer e dar sustentabilidade aos eventos cinematográficos – os Festivais Internacionais de Cinema - que salvam a cara de um Estado que não tem defendido sequer através de cotas de exibição, o cinema europeu- e o português em particular- e o cinema independente no mercado. Faltará ainda, e logicamente, incentivar promotores cinéfilos a divulgar o cinema que se vai fazendo por esse mundo fora.
Daí a importância da criação dessa rede de salas de cinema, projecto que teria de ser assumido em parceria com as autarquias, tal como aconteceu com a criação do circuito de Teatros Municipais e que, em conjugação com os Festivais de Cinema e os agentes culturais que trabalham e promovem o audiovisual, garantisse uma alternativa credível e profissional ao circuito dito “comercial”.
O orçamento do ICA feito tendo por base a nova Lei do Cinema, continua a não contemplar a existência deste circuito nem a sustentabilidade dos Festivais e iniciativas de promoção cinematográfica. Está prevista uma dotação orçamental de valor ainda mais baixo da que é atribuída, a fundo perdido, para a realização de um filme, para TODOS os Festivais Internacionais de Cinema portugueses (basta dizer que o apoio do Estado espanhol exclusivamente ao festival de San Sebastian é o dobro desse valor) e uma segunda verba, ainda menor, para “outras iniciativas”.
Fica aqui um apelo à Secretaria de Estado da Cultura, ao Estado: a criação deste circuito seria fundamental para a sustentabilidade dos agentes culturais que desenvolvem trabalho na área do audiovisual e permitiria o reaparecimento de novos distribuidores cinematográficos. Sem ele, estamos a “matar” essas estruturas, a diversidade cultural, a qualidade, a formação e, logicamente, a indústria Cultural que mais espectadores atrai.
O Estado está a apoiar mais o cinema ou as empresas privadas estão a apoiar menos? E porquê?
MD: Não é verdade que o Estado esteja a apoiar mais o cinema...mas lá vai apoiando (mas cada vez menos). Quanto às empresas privadas...todas as mais fortes foram para Lisboa levando consigo os seus departamentos de marketing e todo o seu poder de decisão. E porque por um lado estamos no Norte e por outro porque a Cultura não é algo importante para as empresas. O futebol, esse sim!!!...
Na 33ª edição do Fantasporto o evento continua a não ser patrocinado pelo Turismo de Portugal. Alguma razão em especial que vos tenha sido apresentada?
MD: Não. Não há politicas de Turismo em Portugal desde que Salazar disse que Portugal era o país dos três F´s Fado, Futebol e Fátima e, após o 25 de Abril, turismo tem sido praia, mar e sol..(com destaque para Lisboa e Algarve). Infelizmente a esta "renovada lógica" juntam-se os tais 3 F´s e assim temos resumidamente as "políticas" de Turismo em Portugal nos últimos 35 anos. É triste... E uma irresponsabilidade politica grave, quando se sabe que esta valência representa 20% do PIB nacional. O problema é não temos ninguém capaz à frente deste sector para "olhar" Portugal e "oferecê-lo" ao Mundo em todas as suas valências, e tantas são...